Durante
algum tempo, a psicologia clínica focou principalmente o diagnóstico e o
tratamento das doenças mentais. Apenas recentemente a atenção tem se
voltado à compreensão e ao cultivo de uma saúde mental positiva.
Alan Wallace e Shauna Shapiro propuseram um modelo para o cultivo do
bem-estar mental, composto por quatro tipos de equilíbrio mental:
Equilíbrio Conativo
O termo conação se refere às faculdades da intenção e da volição. Por
exemplo, a intenção de passar mais tempo com seus filhos ou de perder
peso são exemplos de conação, com uma intenção ou um objetivo, onde há
um comprometimento maior do que no caso de um simples desejo.
O equilíbrio conativo implica intenções e volições que conduzem ao
bem-estar. Um deficit conativo se caracteriza pela apatia ou perda de
motivação para buscar a felicidade; a hiperatividade conativa está
presente quando há uma fixação em objetivos obsessivos, que obscurecem a
realidade. Por fim, a disfunção conativa implica desejar algo que
prejudica o bem-estar próprio ou de outros.
O cultivo do equilíbrio conativo não é simplesmente trocar um
objetivo por outro, mas envolve a prática de cultivar intenções e
motivações positivas, no âmbito mais elevado e significativo, em
especial no longo prazo.
Equilíbrio da Atenção
A habilidade de sustentar voluntariamente a atenção é de extrema
importância para a saúde mental e para realizar qualquer atividade
significativa. O deficit de atenção caracteriza-se pela dificuldade em
manter a atenção nítida em um objeto de escolha. A hiperatividade da
atenção ocorre quando a mente está excessivamente estimulada, resultando
em distração e agitação compulsivas. Estes desequilíbrios podem ser
remediados por meio do cultivo da atenção plena, em que se mantém voluntariamente a atenção sobre o objeto de escolha, sem se esquecer e sem se distrair; e da meta-atenção ou introspecção,
que é a habilidade de monitorar o estado da mente, reconhecendo
rapidamente quando a atenção sucumbiu à agitação ou à lassidão.
Uma das práticas mais conhecidas para desenvolver o equilíbrio da
atenção é a atenção plena à respiração. Nessa prática, a atenção é
focada nas sensações táteis da respiração, em qualquer lugar do corpo
onde forem evidentes; em geral, se observa as sensações no abdomen ou as
decorrentes da passagem do ar pelas narinas. Enquanto se mantém a
atenção engajada continuamente à respiração, monitora-se o processo
meditativo meta-cognitivamente, buscando reconhecer rapidamente o torpor
ou a agitação.
As práticas de shamatha são capazes de levar o equilíbrio da
atenção a níveis excepcionais, e envolvem o cultivo do relaxamento, da
estabilidade e, por fim, da vivacidade da atenção mental.
Sem este tipo de treinamento, como afirmou William James, “comparado ao que deveríamos ser, estamos apenas semi-despertos”.
Equilíbrio Cognitivo
Este tipo de equilíbrio significa engajar-se com o mundo das
experiências sem a imposição de premissas conceituais ou idéias sobre os
eventos, que levam à incompreensão e à distorção. Envolve estar calma e
claramente presente com as experiências tal como surgem, a cada
momento.
Pessoas com desequilíbrios cognitivos graves perdem completamente a
conexão com a realidade. Pessoas com deficits cognitivos parecem estar
sempre ausentes; em outros casos, de hiperatividade cognitiva, ficam
presas em suas premissas e expectativas, com dificuldades para
distinguir a percepção da realidade de suas fantasias; e podem também
compreender os eventos de forma errônea, quando há uma disfunção
cognitiva.
Superar estes desequilíbrios cognitivos é um tema central. A
principal intervenção é a aplicação discriminativa da atenção plena ao
que quer que surja, a cada momento. A atenção plena é inicialmente
cultivada para corrigir os desequilíbrios da atenção, na prática com
foco na respiração; posteriormente, essa habilidade é aplicada à
experiência cotidiana, para atingir o equilibrio cognitivo. O primeiro
desafio é aprender como observar o que está sendo apresentado aos
sentidos e desenvolver uma consciência dos próprios processos mentais.
As quatro aplicações da atenção plena são: corpo, sensações, processos e
estados mentais e fenômenos em geral.
Equilíbrio Afetivo
Neste modelo, o equilíbrio afetivo é o resultado natural dos
equilíbrios conativo, da atenção e cognitivo; mas a excessiva vacilação
emocional, a apatia emocional e emoções inapropriadas podem perturbar
essas outras facetas do equilíbrio mental.
Neste modelo, as intervenções para este tipo de desequilíbrio são o
cultivo de qualidade positivas como a bondade amorosa, a compaixão, a
alegria empática e a equanimidade, por meio de meditações discursivas.
Por fim, a mente humana não é intrinsecamente desequilibrada; é
apenas habituada ao desequilíbrio. Portanto, com um empenho contínuo e
habilidoso, esses desequilíbrios podem ser corrigidos, resultando em um
estado de bem-estar que não é dependente de estímulos sensoriais
agradáveis, comportamentais, intelectuais ou estéticos.
Original e mais posts de Jeanne Pili em http://equilibrando.me/tag/shamatha/
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