quarta-feira, 17 de julho de 2013

Respirando conscientemente, vivendo plenamente


Esta palestra por Thây Nhat Hanh está entremeada com sons do sino - como normalmente acontece nos retiros guiados pelo Mestre. Este é o sino do despertar da consciência plena lembrando aos ouvintes e leitores, aqui no caso, a retornarem à sua respiração no momento presente. Pois só habitando o aqui e agora, nosso verdadeiro lar, podemos tocar a natureza última de tudo o que existe.


Inspirando, eu sei que estou inspirando

Expirando, eu sei que estou expirando

Inspirando, expirando


Hoje, darei instruções sobre a respiração. É tão importante. Se você não souber praticar a respiração consciente, será muito difícil acompanhar o retiro.


O primeiro exercício chama-se inspirando-expirando. Significa que ao inspirar, eu sei que estou inspirando e ao expirar eu sei que estou expirando. Esta é uma prática muito importante. Quando você inspira, sabe que esta é sua inspiração e não a sua expiração. E quando você solta o ar, sabe que esta é sua expiração. É só isso, mas esta é uma prática muito importante. Este é o primeiro exercício de respiracão que Buda nos presenteou.



Quando praticamos desta maneira, algo maravilhoso acontece: paramos de pensar; e isso já é um milagre, porque em nossa vida diária nós pensamos demais. E porque pensamos demais não somos verdadeiramente nós mesmos. O nosso corpo pode estar aqui, mas a nossa mente está em outro lugar, no passado ou no futuro.

Portanto, quando você inspira e expira tornando-se consciente da sua inspiração, você pára de pensar e começa a ficar onde o seu corpo está. 

O nosso corpo e mente se encontram quase sempre separados um do outro. Se praticarmos inspirar e expirar com alguma concentração, atingimos o que chamamos de unidade corpo-mente. O corpo e a mente são reunificados, e você começa a ficar presente sendo verdadeiramente você mesmo. Este é o primeiro fruto da sua prática, que requer que você inspire e expire consciente da sua inspiração e expiração.


Quando você não está presente, quando você não está realmente ali, não consegue ver as coisas com clareza e profundidade. Você deixa tudo escapar. Tudo lhe parece obscuro e vago.


Suponhamos que a sua mãe esteja ali sentada, mas somente o corpo dela está lá, a mente dela esté noutro lugar. Se você chegar, neste momento, e quiser ter alguma atenção de sua mãezinha, algum carinho; bem..., você não terá sucesso, pois ela não está realmente presente, ela não está disponível para você; e isso acontece com muita freqüência.


Nós nos tornamos presentes inspirando e expirando [conscientemente]. Inspirando.... expirando... começamos a ficar vivos, presentes.



A Consciência plena do momento presente


Esta é a prática da consciência plena. Consciência plena significa estar ciente do que está acontecendo.
Imagine que o seu filho está chegando e quer alguma atenção, algum carinho. Você sabe disso, e então sorri para ele. Você pode abrir os braços e abraçá-lo, e a condição básica é que você esteja presente. Portanto, inspirar e expirar significa estar realmente presente e disponível. Disponível pra quem? Disponível para as pessoas amadas. E também estar pronto para encontrar a vida, pois a vida só pode existir no momento presente.

Vamos pensar um pouco...o lindo céu azul...

Quando você pode entrar em contato com o céu azul? 
  No momento presente. 

Para o céu azul não passar despercebido, você deve retornar ao momento presente, porque é naquele momento que você pode entrar em contato com o céu azul. Os belos rios, as lindas árvores, sua mãezinha, seu paizinho, eles estão todos no momento presente, e se você retornar ao momento presente você os encontrará.





Tudo o que existe de maravilhoso, tudo o que é revigorante, está no momento presente. Portanto, ao correr em direção ao futuro ou se perder no passado você deixa de desfrutar a vida. Por isso, inspirar e expirar conscientemente significa retornar ao momento, quando você tem um encontro marcado com a vida.

                                                   
O Reino de Deus

Aquilo que você procura, como a felicidade, a paz, a alegria, tudo está no momento presente. 

A Terra Pura dos budistas deve ser encontrada no momento presente. O Reino dos Céus dos católicos, dos protestantes
também deve ser encontrado no momento presente.



Olhe para a árvore. Uma árvore é uma coisa maravilhosa. Uma árvore é muito linda. Uma árvore, para mim, é tão bonita como uma catedral, até mais bonita. Eu olhei para a árvore e vi todo o cosmos dentro dela. Eu vi a luz do sol na árvore. Você consegue ver a luz do sol na árvore? Sim, porque sem a luz solar nenhuma árvore pode crescer. Eu vejo uma nuvem na árvore. Você consegue ver? Sem nuvem não pode haver chuva, nem árvore. Eu vejo a Terra dentro da árvore, eu vejo tudo numa árvore.
 
Então, tudo no cosmos penetra numa árvore, e o cosmos se revela a mim através de uma árvore. Por isso, uma árvore, para mim, é uma catedral e eu posso me refugiar numa árvore e posso ser nutrido pela árvore. A árvore pertence ao reino de Deus, a árvore pertence à Terra Pura. E eu só posso entrar em contato com a árvore se eu retornar ao momento presente, porque a árvore só pode ser descoberta no momento presente. Por isso, inspirar e expirar é tão importante.


Suponha que eu pratique assim: inspirando, estou ciente dos meus olhos. Expirando, sorrio para os meus olhos. Esta é uma forma de retornar ao momento presente para descobrir coisas que tendemos a esquecer, como os nossos olhos. Estou feliz por ter olhos. Meus olhos são condições para a minha felicidade. Eu só posso ver o lindo céu azul, a terra, as crianças, os adultos, todos os tipos de formas, todos os tipos de cores, porque tenho olhos. Então, inspirar para retornar ao momento presente e entrar em contato com os meus olhos é uma prática fundamental à felicidade. Ao expirar sorrio para os meus olhos. Sorrio para os meus olhos porque estou feliz de ter olhos. Preciso apenas abrir os olhos para ver a beleza das árvores e tudo o mais.


Vamos inspirar e expirar algumas vezes e nos tornar conscientes do fato de que temos olhos. Se desejar, você pode entrar em contato com os seus olhos através da respiração...


Então, os meus olhos pertencem ao Reino de Deus, pertencem à Terra Pura. Os meus olhos são condições para a minha felicidade. Eu retorno ao momento presente para tocar os meus olhos, e assim ser feliz.


Sabe de uma coisa? Tem gente que acredita que pode entrar no Reino de Deus ou na Terra Pura depois de morrer. Eu não concordo com isso. Eu entendo que a pessoa não tem que morrer para entrar no Reino de Deus. De fato, você tem que está muito vivo para tanto. Você deve estar vivo, deve inspirar e expirar e dar um passo e com um pé entra no Reino de Deus neste exato momento; e isto é possível com o primeiro exercício: inspirando e expirando.


Como os meus olhos pertencem ao Reino de Deus, as árvores pertencem ao Reino de Deus e muitas outras coisas, se eu me tornar consciente disso, através da respiração, só preciso dar um passo para entrar no Reino dos Céus. Com alguma prática, você desenvolve a sua concentração e assim toda vez que quiser entrar no Reino dos Céus poderá fazê-lo, pois a porta está escancarada.


Mas se você vive em esquecimento, você não consegue fazer isso, porque o esquecimento é o oposto da consciência plena.



O esquecimento


Viver em esquecimento significa se perder no passado, no futuro, significa estar possuído pela raiva, ódio, medo, e assim você não está preparado entrar no Reino de Deus. Para se livrar do esquecimento, você pratica inspirando e expirando conscientemente, e a consciência plena se torna o resultado da sua prática. Com consciência plena você entra em contato com tudo o que é maravilhoso, que é restaurador e saudável no momento presente.

Então vamos convidar um toque de sino e respirar juntos três vezes, para nos alegrar e desfrutar o reino que nos encontramos neste exato momento.



Agora vamos passar para o segundo exercício: Flor viçosa.

Inspirando eu me vejo como uma flor. 
Expirando eu me sinto cheio de frescor.

Os humanos nascem como flores. Quando olho para uma criança, vejo-a como uma flor muito viçosa, muito bonita. 


Vejam bem, nossos olhos são como flores.

Nos Sutras, os olhos de Buda são descritos como flores de lótus.


Nossos lábios pode ser uma bela flor, especialmente quando sorrimos e sabemos como sorrir. 

Esta é uma flor que podemos oferecer a qualquer pessoa a qualquer momento.  Apenas inspire e expire e sorria que você terá uma flor  desabrochada.
 
E sabe de uma coisa? Os seus olhos também podem sorrir. Assim, quando você olha para alguém e sorri com os seus olhos você oferece duas flores. 


E se sorrir com sua boca, você oferece três flores.

Suas mãos também são como flores.

E com minhas mãos eu posso formar uma flor, uma flor de lótus.
Quando eu cumprimento alguém, digo algo assim: "uma flor pra você, um Buda a ser". Curvo-me reverenciando àquela pessoa. Então, minhas mãos são flores, se fizerem as pessoas felizes. E quando ofereço uma flor de lótus àquela pessoa, ofereço uma flor com minha boca e duas outras com os meus olhos.
Nascemos como flores, mas se não soubermos cuidar das nossas flores, elas podem se desgastar e murchar. Quando você inspira profundamente, você faz com que cada célula do seu corpo sorria como uma flor, tornando-se viçosa novamente, para o seu próprio benefício e felicidade e também pela felicidade das pessoas à sua volta.
Se você não tem frescor, se você se sente humilhado, ou se está irritado, as pessoas à sua volta não conseguem ficar felizes. Por isso, pratique tornar-se uma flor novamente. 

Pratique "inspirando eu me vejo como uma flor, expirando eu me sinto viçoso".

Buda praticou para revigorar-se. Por isso, quando olhamos para ele, o vemos como uma flor. Ele é descrito sentado sobre uma flor de lótus. Isto significa que onde quer que ele esteja sentado, ele está sentado em paz, feliz, revigorado, porque ele é a própria flor.

Quando você se sentar em sua almofada, sente-se de tal modo que se torne uma flor. Assim, de repente, sua almofada se tornará uma flor de lótus. Ao praticar o caminho de Buda, você deve se sentar sobre uma flor de lótus e não sobre carvões em brasa [risos].

Quando você está cheio de preocupações, com muita raiva dentro de si, você não consegue sentar-se sobre uma flor, você se senta sobre carvões em brasa. Você não tem paz alguma. Logo que se senta, você quer sair correndo de novo. Assim, o lótus não está disponível. 

Para que o lótus esteja disponível enquanto um assento para você, pratique tornar-se uma flor, Flor Viçosa, que é o segundo exercício. Se você praticar desta forma, três, quatro vezes, você se tornará viçoso e desfrutará disso.

Vamos agora passar para o terceiro exercício: Montanha Sólida.


Inspirando, eu me vejo como uma montanha
Expirando, eu me sinto sólida
Montanha sólida  



Nesta posição de lótus ou meio-lótus você se encontra bem estável, sólido. 

Se você se sentir agitado, sem firmeza, vulnerável, frágil, então pratique assim para se tornar sólido novamente. 

A solidez e estabilidade do corpo ajudará a fazer surgir estabilidade mental. 

Portanto, sente-se numa posição estável

e pratique inspirando e expirando,  e você se tornará mais estabilizado mentalmente.
Inspirando, eu me vejo como uma montanha, 
expirando, eu me sinto sólido.

 De tempos em tempos uma emoção muito forte nos domina - esta emoção pode ser raiva, ou desespero, ou medo, etc. E quando estamos completamente dominados por uma emoção forte nos sentimos muito vulneráveis, podemos morrer. Isto é muito ruim, porque somos muito mais do que nossas emoções; somos mais fortes do que somos capazes de imaginar. Por isso é muito benéfico praticar ser sólido como uma montanha.

Quando você observa uma árvore numa tempestade, você vê que o topo da árvore não está firme. Você pode ver os galhos finos e muitas folhas no topo da árvore balançando pra lá e pra cá. Você tem a impressão que a árvore é muito vulnerável, muito frágil. 

Mas se você ver que a árvore está firmemente enraizada no chão, a impressão de que a árvore é vulnerável desaparecerá. Você verá que a árvore é muito mais forte do que aparenta no topo.
 
Nós, o corpo humano, a pessoa humana também é assim. Temos as emoções no topo e temos o tronco aqui em baixo. Nosso tronco está em algum lugar neste nível aqui um pouco abaixo do umbigo.  E com esta posição sentada, se você trouxer a atenção pra baixo, neste nível, e praticar inspirando e expirando seguindo o movimento do seu abdômen... inspirando, expirando, eu me vejo como uma montanha, eu me sinto sólido...

Se você praticar desta forma, uma, duas três vezes, suas emoções não mais conseguirão destruí-lo. Agora você sabe que é maior do que suas emoções. 

Por isso este exercício é muito importante. Devemos praticá-lo todos os dias. Para que quando nos defrontemos com fortes emoções, saibamos o que fazer para manobrá-las.

Vamos praticar este exercício algumas vezes. 
"Inspirando eu me vejo como uma montanha; expirando eu me sinto sólido". 

Tente se sentar de uma forma sólida para praticar isso

Você não tem que usar todas as palavras

Você apenas retém as palavras: montanha para a inalação e sólida para a exalação:

Montanha sólida.

Vamos agora praticar o quarto exercício que se chama Espelho D'água.



 Inspirando, eu me vejo como um espelho d'água

Expirando, eu reflito tudo o que existe

Espelho d'água refletindo



Vamos visualizar um lago num planalto entre as montanhas. A água está tão quieta que reflete fielmente o céu azul e as montanhas. 

E se você olha para a água vê sua face sem distorção alguma, porque a água está calma e tranquila. 

Se você tirar uma foto do lago, verá que a montanha e o céu refletidos nele são simplesmente a montanha e o céu do alto. 
Então, quando você pratica a inspiração diz: "Eu me vejo como um espelho d'água", isto lhe acalmará através da respiração. Sua respiração pode se tornar um intrumento maravilhoso para acalmá-lo, e quando você expira você vê naquele estado de calma a quietude que você reflete as coisas como elas são. Você não mais as distorce. 




Quando não estamos calmos distorcemos as coisas e não conseguimos receber as mensagens das outras pessoas, não conseguimos receber a verdade dos outros seres.



Suponha que a lua, a bela lua no céu, queira refletir-se na água de seu açude, mas a água do seu açude não está calma. Como poderia a lua cheia ser refletida em você?

 Portanto a falha não é da lua, a falha é da água. Se o açude da mente dos seres vivos estiver calmo, a bela lua se reflitirá na água.



Há um antigo poema que li quando era jovem, que diz: se você estiver tranqüilo, suas percepções serão corretas e você compreenderá o que as pessoas estão tentando lhe dizer. A lua, as montanhas, os rios, as árvores, tudo está tentando nos falar a verdade. Mas porque a água de nossas mentes não está calma, somos incapazes de receber a verdade do cosmos, e, por isso, devemos praticar inspirando-expirando, e nos acalmar para que a verdadeira compreensão seja possível.



Sentar-se calmamente, inspirando, expirando, é uma forma maravilhosa de se acalmar para ser como um espelho d'água.


O quinto exercício se chama Espaço Desimpedido:

Inspirando, eu me vejo como o espaço
Expirando, eu me sinto livre
Espaço desimpedido

 
O espaço é o símbolo da liberdade. Se você não tiver espaço à sua volta, não conseguirá se mover. Portanto, se você quer ser feliz deve se permitir algum espaço à sua volta e dentro de si. 

A lua refrescante de Buda está viajando no céu da vacuidade máxima. Buda tem muito espaço dentro e fora de si, e por isso ele consegue ser feliz. 

As pessoas que têm espaço dentro e em volta delas mesmas são mais felizes do que as que não têm. Por isso, esta prática objetiva trazer espaço para dentro de você e a sua volta.


Se você quer que o seu amado seja feliz, ofereça a ele algum espaço interno e externo. 
Se você quer ser feliz, permita-se algum espaço interno e externo.


Quando você arruma flores, deve entender que cada flor precisa de algum espaço em volta dela. Uma flor como esta aqui precisaria deste tanto de espaço - pelo menos para que irradie sua beleza e frescor. 


Então, da próxima vez quando você fizer um arranjo de flores, não coloque muitas flores. Você precisa de apenas duas ou três, e dê a cada flor muito espaço.
 
Os seres humanos são como flores, eles são flores e devem se permitir espaço interior e exterior para serem felizes. 


Então praticar desta forma significa permitir algum espaço interior e exteriror.
 


Este espaço aqui não pode ser alugado. No caminho vindo pra cá eu vi uma placa na rua: "aluga-se este espaço" (risos). Este espaço [ao qual estou me referindo] só pode ser obtido através da prática.   

Você pratica para oferecer liberdade, para oferecer vacuidade para você e para os outros. Se você tem muitos projetos, se você é diretor de muitas companhias, não tem espaço. Como poderia ser feliz? 

Então experimente fazer esta prática para ter algum espaço interior e a sua volta.



Buda e a iluminação

Eu gostaria de dizer aos jovens que Buda não é Deus; ele é um ser humano como nós. A palavra Buda significa a pessoa que está desperta. O verbo sânscrito, bud significa despertar, e Buda significa aquele que é desperto. Se praticarmos o despertar, nos tornamos um Buda. 

Quando você pratica inspirando-expirando e o seu corpo e mente se unem, se tornam um; e você está ali no momento presente, você é, em grande medida, um Buda. A diferença é que o Buda, um Buda pleno, é alguém que está desperto o dia inteiro. Enquanto nós nos tornamos despertos somente de tempos em tempos. É por isso que precisamos praticar a respiração consciente, para nos tornarmos mais despertos na vida diária. 

Eu falo sobre consciência, falo sobre a iluminação porque a iluminação e a consciência têm a mesma substância, e hoje temos a expressão consciência plena que é sinônima. Quando você está plenamente consciente do que está acontecendo, você está iluminado. 


Suponha que eu pratique: Inspirando, estou ciente de que tenho olhos em boas condições, expirando sorrio para os meus olhos. Isto é consciência, isto é consciência plena de ter bons olhos, mas isto também é iluminação, porque se eu tenho olhos em bom estado, mas não sei disso, não estou iluminado de forma alguma. Então, estar iluminado significa a mesma coisa de estar consciente, e você pode ser iluminado todo instante se tiver este tipo de consciência.

Mas muitos de nós, passamos nossos dias "em esquecimento". Vivemos e, no entanto, não vivemos. Ficamos perdidos no passado. Nós nos preocupamos tanto com o futuro. Temos medo dele. Fazemos tantos projetos, ficamos nervosos com relação ao futuro, não temos capacidade alguma de estar vivo no momento presente onde tudo existe. As pessoas que vivem desta forma vivem em esquecimento, e a vida não está disponível para elas. Elas vivem como uma pessoa que carrega um corpo morto nos ombros, vagueando por aí. Ela já está morta.

A técnica da ressurreição


O desafio, então, é despertar, tornar-se vivo novamente, ressuscitarmo-nos.

A técnica da ressureição é retornar à respiração: inspirando, estou vivo; expirando eu sorrio para mim mesmo. Isto parece demasiadamente simples mas é a prática mais importante, porque muitos de nós não sabemos o quão miraculoso é estar vivo neste presente momento. Por conseguinte, deixamos de desfrutar a Terra Pura, deixamos de desfrutar o Reino de Deus.


Passado, presente e futuro

Eu tenho falado sobre o momento presente e parece como se eu estivesse aconselhando as pessoas a não olharem retrospectivamente ao passado ou adiante para o futuro. Sem olhar retrospectivamente ao passado, como você poderá aprender com o passado? Se não fizer planos para o futuro, como poderá preparar algo para os seus filhos e netos?

O ensinamento diz assim: o presente é feito do passado. O passado ainda está vivo no momento presente. Se você estiver cônscio, desperto e plenamente consciente, se for capaz de tocar o momento presente, também tocará o passado, pois o presente é feito do passado. Então existe a possibilidade de mudar o passado. Mesmo se acharmos que não podemos retornar ao passado para consertar as coisas lá.

Suponha que cometemos um erro no passado, quebramos algo e hoje nos arrependemos, e vivemos com nosso complexo de culpa. E muitas pessoas não têm paz porque a culpa é muito intensa.
Mas se elas aprendem e descobrem que o passado ainda vive no presente, se elas inspirarem e expirarem tornando-se plenamente conscientes, quando tocarem o presente elas tocarão o passado e poderão mudar o passado mudando o presente.

Suponha que você disse algo não muito amável à sua avó há vinte anos e agora se arrepende disso. O que você pode fazer para se livrar da culpa e ser gentil novamente com sua avó? Olhe profundamente para o momento presente, olhe para você, que compreenderá que vovó ainda está viva em você; você é apenas uma continuação dela. 


Então, olhe profundamente e veja vovó sorrindo para você, dentro de você, e com esta consciência plena diga simplesmente: "vovó, desculpe-me", e então você a vê sorrindo para você e a ferida será curada muito rapidamente.

Não precisa viver se sentindo angustiado, culpado. A culpa é um obstáculo à prática, e como você pode tocar o passado no presente, por que não realizar a cura neste exato momento?

Quando você está firmemente estabelecido no momento presente, você pode se voltar ao passado. Você olha o presente com tanta profundidade que consegue ver todos os elementos que compuseram o momento presente. Elementos estes que podem ser descritos como sendo o passado. 


Você também aprende que o futuro será construído do momento presente. O  momento presente é a substância com a qual o futuro será manufaturado. Portanto, a melhor maneira de cuidar do futuro é cuidando do momento presente. O que mais você poderia fazer?

Se você cuidar bem do momento presente, não haverá razão alguma para se preocupar com o futuro, porque você sabe que o futuro será criado a partir do presente.

Por isso a esperança é as vezes um obstáculo. As pessoas têm a tendência de ter esperança porque se sentem impotentes no presente. Elas acham que o momento presente é tão pesado, tão insuportável e tão difícil de ser suportado que por isso investem no futuro com esperança. "Eu espero que amanhã seja melhor, que depois de amanhã as coisas melhorem". E elas ficam um pouco aliviadas por estarem investindo no futuro.

É por isso que as religiões falam muito do futuro, da esperança. Mas à luz desta prática, esperança pode ser um obstáculo porque ao investir no futuro você tem que gastar muita energia com esperança e sobra muito pouca energia para você cuidar do presente. E sem energia suficiente não conseguimos ter sucesso. Você não consegue penetrar no Reino de Deus.

Portanto, não fique esperançoso e também poupe a sua energia retornando e penetrando o momento presente. Esta é a prática.
Ser desperto
Ser desperto significa estar consciente do que está acontecendo no seu corpo, nos seus sentimentos, nas suas percepções e formações mentais e no mundo à sua volta.

Perceber que as árvores são belas - isto é ter consciência. 
 Saber que muitas árvores estão sendo derrubadas - isto é ter consciência. 


 
Consciência do que está acontecendo de bom e do lado que não é tão bom.

Estar consciente do lado bom das coisas para entrar em contato com elas e ser nutrido por elas. Entrar em contato com aquilo que não é tão bom para mudar, ajudar a por um fim e transformar aquilo. É assim que a prática da consciência plena beneficia você.

Hoje, eu gostaria de falar sobre o primeiro lado, que não está errado; de entrar em contato com este lado.


Hoje de manhã, quando eu vinha andando do prédio  até a sala de meditação, eu entrei em contato com o brilho do sol, com as belas árvores, e dei passadas sobre a terra. 


Eu me senti muito feliz,  nutrido pela beleza do céu, da luz do sol, a beleza das árvores. 

Quando eu toquei a terra, sabia que aquela terra, nossa mãe, ainda estava ali. Eu me nutri com o fato de que estou vivo e andando sobre a terra. 

Então eu plantei dentro de mim várias sementes de felicidade. Eu sei que isso é muito importante, porque se eu não tiver felicidade suficiente dentro de mim, eu não posso ser capaz de ajudar outras pessoas, outros seres vivos. 

É por isso que a prática diária de aguar as sementes de nossa felicidade e alegria é tão importante.

Todo mundo pode praticar ser consciente da existência dos próprios olhos, do fato de estar vivo. E a semente desta consciência é chamada de semente da consciência plena.

Mas como vivemos [distraídos] em esquecimento, as sementes da consciência plena estiveram por muito tempo profundamente enterrada em nossa consciência. Praticar agora significa regar as sementes de consciência plena dentro de nós, para que elas se tornem importantes e manifestas em nosso ser com mais freqüência.

Texto extraído do CD The Arte of Mindful Living por Thich Nhat Hanh, Sounds True, tradução e edição por Tâm Vãn Lang (Maria G R Oliveira), imagens do Google images.

Um comentário:

  1. Walterbjr
    bacana o blog. Domingo que vem tem o nat em casa. Vc está convidado. um abraço
    dad

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